Campanha da Fraternidade Ecumênica 2021: “Fraternidade e diálogo: compromisso de amor”
Anos atrás, em um convento carmelita, estávamos reunidos para uma formação semanal. Um dos frades apresentava sobre Santa Teresa. Durante o encontro, eu e um outro confrade começamos a defender pontos de vista diferentes sobre a espiritualidade da santa. A discussão esquentou e nós dois seguimos defendendo nossas opiniões.
No final, saí feliz e com um sentimento de orgulho por ter “ganhado” a discussão. Ainda enquanto tomava um chá e escutava dos outros elogios pela “vitória”, percebi quão infantil havia sido, pois travamos um debate, mas não um diálogo.
A Campanha da Fraternidade Ecumênica 2021 traz como tema “Fraternidade e diálogo: compromisso de amor”. O diálogo não é apenas o estabelecimento de uma conversa qualquer. Também não é mera apresentação de pontos de vista diferentes em um debate ou discussão ou uma arte de convencimento.
Diálogo é uma capacidade de estabelecer uma conexão mais profunda entre duas identidades sem que nenhuma seja anulada. Quem participa de um diálogo, sai mais rico do que chegou, pois deixa um pouco de si e leva um pouco do outro. No diálogo, todos ganham. Os monólogos, como diz o papa Francisco, “não envolvem ninguém, a ponto de seus conteúdos muitas vezes serem oportunistas e contraditórios” (Fratelli Tutti, 200).
A Campanha da Fraternidade é um modo concreto de vivenciar a conversão quaresmal. Contemplando os crucificados de nosso tempo, anunciamos a esperança da Ressurreição. Como toda forma de conversão, o tema desse ano nos desafia, nos desinstala, pois nos convida a sair de nossa zona de conforto para olhar além de nossa realidade – isso é quando a pessoa mesma não está envolta de formas de violência, consciente ou inconscientemente.
O documento, com números e dados de órgãos competentes, apresenta uma fotografia da violência em relação a alguns setores que sofrem mais em nosso país, tais como a juventude negra, as mulheres, os povos tradicionais, os imigrantes e os pertencentes à comunidade LGTBTQ+. Jesus é o príncipe da paz. Daquilo que era dividido, fez uma unidade (Ef. 2,14a). É necessário denunciar toda e qualquer forma de violência. O compromisso a ser assumido é aquilo que Jesus apresentou como seu mandamento maior: o amor!
Jesus é diálogo, desde sua comunhão trinitária (cf. Jo 10, 14-19) até o cotidiano de sua vida expresso nos Evangelhos (cf. Lc 19,1-13; Mc 7, 24-30). E quando, subiu aos céus, deixou o Espírito Santo para falar em nós (cf. Lc 12,11-12). Sua acolhida e as suas palavras eram sinais desse diálogo. A partir do Evangelho da Quarta Feira de Cinzas (cf. Mt 6,1-18), podemos pensar o diálogo sobre o tripé da oração (diálogo com Deus); do jejum (diálogo comigo mesmo); e da esmola (diálogo com os irmãos).
Quando Jesus de Nazaré se encontrou com a samaritana, trovou uma longa conversa com ela (cf. Jo 4,1-45). De semelhante beleza está a experiência do encontro de Cristo com os discípulos que iam para Emaús (cf. Lc 24, 13-35). Nos dois casos apresentados, aqueles que se encontraram com ele foram em busca de outros para anunciar sua Boa-Nova. Os corações arderam quando dialogaram com Jesus: “se o o coração arde em chamas pela Palavra, os pés partem sem missão” (CEF 17).
O objetivo dessa campanha, que reuniu, no texto-base a compreensão de sete igrejas cristãs diferentes, por meio do Conselho Nacional de Igreja Cristãs (CONIC), é “convidar as comunidades de fé e pessoa de boa vontade a pensarem, avaliarem e identificarem caminhos para superar as polarizações e violências através do diálogo amoroso, testemunhando a unidade na diversidade” (CEF 3).
Para tanto, é fundamental fazermos uma leitura da ação pastoral desempenhada por nossa igrejas e comunidades: nossas práticas pastorais caminham para a paz e o diálogo ou contribuímos com a cultura do ódio e da intolerância? Sabemos ouvir, acolher e dialogar com o diferente?
Nesse sentido, “as comunidades cristãs são chamadas a serem este espaço, que gera esperança e possibilita sonhar, exercitar e concretizar a Boa-Nova de que podemos ser protagonistas de histórias sem discriminações, preconceitos e violências” (CFE 139). Não devemos reproduzir modelos de polarização, preconceito, intolerância, exclusão e violência entre nós cristãos – e nem com os outros. Isso seria um grande contra-testemunho de nossa fé.
Na fidelidade a Jesus, somos convidados a fortalecer a amizade social, o ecumenismo e a caridade cristã, para que juntos, como igrejas cristãs, possamos construir uma sociedade mais humana e fraterna. Desse modo, lhe encorajando a ler o texto-base e a procurar crescer em diálogo, concluímos com uma bela poesia do Cardeal José Tolentino:
“Livra-nos do vírus do individualismo que faz crescer as muralhas, mas explode em nosso redor todas as pontes.
Livra-nos do vírus da comunicação vazia em doses massivas, pois essa se sobrepõe à verdade das palavras que nos chegam do silêncio.
Livra-nos do vírus da impotência, pois uma das coisas mais urgentes a aprender é o poder da nossa vulnerabilidade”.
Frei Edimar Fernando Moreira, Carmelita